Um Conto de Fadas da Vida Real
Um conto de fadas da vida real-Comparações do cotidiano da Imperatriz Elizabeth com a imigração alemã em Juiz de Fora!
Por Sabrina Munck do Nascimento¹
"Folclore não são apenas folguedos e festas. É uma história construída pelos anseias, aspirações e esperanças de um povo, é uma linguagem na qual se manifesta á unidade que mobiliza multidões, que busca a sua verdade na identificação da cidadania, preservando seus valores e mantendo vivas suas raízes através das gerações". (Claudia Maria Assis Rocha)
O termo Folclore foi definido pelo inglês William John Toms, que o conceituou como "Sabedoria do povo". Considerando este conceito, todos aqueles que promovem o folclore estão inseridos dentro deste processo cultural. O folclore alemão preservado e mantido pelas comunidades juizforanas se torna verdade vivenciada por meio das suas várias manifestações culturais, ou seja, não é fácil manter vivo um folclore se ele não for realidade para aqueles que o manifestam. Para entendermos sobre as manifestações culturais do folclore alemão na cidade de Juiz de Fora, temos de conhecer um pouco da trajetória histórica da Prússia, atual Alemanha.
Sabemos que imigração alemã ocorreu para várias regiões da América, inclusive para a América Latina. O processo de imigração sentidas no século XIX se deu pelas insatisfações sócio, político e econômicas que foram vivenciadas pelos nossos antepassados, reflexos do Congresso em Viena de 1815. Neste congresso a Prússia foi dividida em partes desiguais composta de reinos, ducados, principados e cidades livres, que seriam governados pelo reino Austriaco que se opunha á unificação prussiana. Essa divisão contribuía para retardar o desenvolvimento econômico capitalista da Prússia, permanecendo a economia alemã predominantemente agrária. Os Estados Alemães ficaram divididos em duas partes não só políticas e econômicas, como geográficas e confessionais. Uma era a Alemanha do Norte, majoritariamente protestante, parcialmente sob domínio da Prússia onde a característica principal era os investimentos em relação á política econômica modernizadora na industrialização2• Ao passo que o sul era católico e mantinha uma economia agrícola medieval baseada na produção familiar de pequenas propriedades, sujeito á política austríaca, e interessado em realizar acordos diplomáticos através de casamentos dinásticos.
O êxodo dos germânicos para os outros países, e para o Brasil, pode ser atribuído á esses fenômenos enfrentados a partir de meados do século XIX. Como podemos notar os imigrantes que vieram para Juiz de Fora no ano de 1858, saíram de um estado totalmente desintegrado. Insatisfeitos com a vida que levavam em seu território, os germânicos foram buscar a realização de seus sonhos no Novo Mundo. Os agentes das
Companhias de imigração se aproveitaram da instabilidade germânica, que não dava condições de sobrevivência para a população, para prometerem uma terra de sonhos e de enriquecimento fácil para os desejosos de paz, felicidade e riqueza.
Ao saírem de sua terra os germânicos deixaram para trás uma longa história de vida para irem ao encontro do desconhecido. Aventureiros foram em busca da realização de seus sonhos. Contratados pela Companhia União Indústria, pertencente ao cafeicultor Mariano Procópio, para a construção da Rodovia União Indústria em Juiz de Fora. Essa rodovia seria uma "ponte" que uniria os interesses do Império aos da região sul da Zona da Mata Mineira e, particularmente, de Juiz de Fora, e, sobretudo, facilitaria o escoamento da produção cafeeira da região da Zona da Mata Mineira para o Porto do Rio de Janeiro. A rodovia possuía uma técnica inovadora trazida pelo Comendador Mariano Procópio, de construção de estradas macadamizadas3• Assim os nossos teutos desvalorizados pela persistência de uma economia agrária de seu país sentiram-se valorizados ao serem contratados como mão de obra-especializada, um futuro promissor convocava-os através dos contratantes empresariais.
Com relação á origem regional dos imigrantes que vieram para Juiz de Fora, é predominante entre os colonos indivíduos do Grão-ducado do Hessen, do Tirol, de Holstein, da Prússia e de Baden. Somente destas cinco regiões, temos 86,98% do total de germânicos contratados pela Cia. União e Indústria. Os outros imigrantes vieram da Saxônia, da Baviera, de Hannover, de Nassau, de Hamburgo, os grupos provenientes de Baden e do Tirol (província austríaca) somavam quase 1/3 do total de imigrantes.
Assim motivados, atravessaram o oceano, passaram por insalubridades, caminharam do porto do Rio de Janeiro até o destino final: Juiz de Fora. Foram instalados (não de imediato) na Colônia D. Pedro II e fizeram a história de Juiz de Fora, deixando para nós um legado inesquecível cheio de lutas, sonhos e realizações, fatos estes que impulsionaram o desenvolvimento econômico, cultural e social da referida cidade. E com este jeito germânico de ser, fizeram de sua história um "conto de fadas", porém um conto real. ? com este espírito empreendedor e aventureiro que trataremos o rumo da identidade germânica na cidade de Juiz de Fora tendo como base á utilização do recurso audiovisual do filme "Sissi", do diretor e roteirista, Ernest Marischka, filmado no ano de 1956 e imortalizado pela atriz Romy Schneider, que encarnou no cinema a insólita imperatriz - uma mulher á frente de seu tempo, exímia amazona, viajante inveterada, poetisa e poliglota.
A utilização de cenas do filme serve para nós, como recurso didático para o melhor entendimento de como se organizaram culturalmente, socialmente e economicamente os nossos antepassados na cidade de Juiz de Fora. Tentaremos fazer um paralelo das cenas rodadas com o cotidiano dos imigrantes alemães na referida cidade. Pois, assim como Sissi, nossos antepassados tiveram um espírito aventureiro, empreendedor e nada convencional. Destacamos também o modo de vida diferente que trouxeram para a região.
Esse modo de vida diferente passa pela alimentação, recheada de batatas, salsichões e regada com muita cerveja. Fato este, que impulsionou a criação de várias cervejarias, artesanalmente desenvolvidas por eles, mas nem tudo era alegria e cerveja. Sua maneira diferente de professar a fé trouxe um problema religioso para a província de Minas Gerais. Os protestantes não poderiam professar sua fé em público e tinham seus direitos restringidos (dentre eles a ausência da legitimação dos casamentos e ausência da regulamentação de herança), causando grande descontentamento entre os religiosos protestantes. Porém o desconforto religioso foi resolvido no ano de 1886, com a construção do primeiro templo protestante da cidade de Juiz de Fora, na Rua General Gomes Carneiro, no bairro Fábrica, denominado: "DeutcheEvangelishegemeinde”.
Podemos notar na história da cidade as marcas deixadas pelos teutos, ? esse o intuito desta apresentação, fazer de uma forma bem suave uma trajetória desses nossos antepassados pelos tempos históricos, mostrando as cenas do filme "Sissi" e comparando as vivências mostradas no mesmo, com o legado deixado por eles na cidade, perpetuado pelas entidades mantenedoras do folclore alemão. Para citar algumas dessas atividades temos a "Deutschefest", realizada no Bairro Borboleta, que mantém a tradição alemã viva na cidade por meio da Associação Cultural e Recreativa Brasil! Alemanha, mantenedora de grupos folclóricos e de comidas típicas. Assim como temos o funcionamento marcante na cidade, da Comunidade Evangélica de Confissão Luterana, e do Funcionamento do Instituto Teuto Willian Dilly também mantendo a cultura por meio de festejos, de grupo de dança e principalmente mantendo um rico acervo documental do legado deixado pelos germânicos.
No filme "Sissi" ? retratado o comportamento pouco convencional de Elisabeth (1837-1898), uma princesa bela e rebelde que se tornaria símbolo de uma época de grandes transformações. Nascida a 24 de dezembro de 1837, Elisabeth Amália Eugenia Von Wittelsbach, duquesa da Baviera era filha do duque Maximiliano e da duquesa Ludoyika da Baviera. A mãe de Francisco José 10 a Imperatriz Maria Teresa (Princesa Imperial e Arquiduquesa da Áustria Princesa Real da Hungria e da Boêmia) queria que ele se casasse com a irmã de Sissi. Helene, de 18 anos. Mas, durante a apresentação formal de Helene, o imperador apaixonou-se por Sissi (então com 15 anos) e, imediatamente, anunciou que se casaria com a mais nova das Wittensbach. Sissi, na verdade, era o apelido da imperatriz Elisabeth lI, que se tornou esposa do imperador da Austria-Hungria, Franz Joseph no dia 24 de abril de 1854 na igreja de Santo Agostinho, em Viena, neste casamento temos a comprovação do interesse Austríaco em realizar acordos diplomáticos através de casamentos dinásticos e da aceitação da autoridade Austríaca por parte da Alemanha do sul.
Várias questões sociais e políticas mostraram o quanto Sissi estava á frente da sua época. Primeiro, ao mudar radicalmente os costumes da corte. Os hábitos cortesãos não tinham nada de glamoroso, muito ao contrário. Nos salões, a falta de higiene pessoal era tamanha que as damas usavam saquinhos de sangue embaixo das saias para atrair as pulgas, evitando que os insetos lhes atacassem. As perucas serviam mais de ninho de piolhos do que de ornamento. A imperatriz acabou com isso - não sem encontrar resistência - insistindo em tomar banho diariamente e mandando instalar salas de banho nos palácios para criar o hábito de higiene. No campo social, Sissi iniciou um programa de alfabetização dos súditos pioneiro na Europa. E politicamente, a imperatriz teve a ousadia de defender o nacionalismo dos estados alemães frente ao seu marido conservador Franz Joseph, fato este que foi decisivo para a criação da monarquia dual (austro-húngaro), em 1867.
E através deste paralelo, que pretendermos perceber o quanto é belo e de suma importância as representações históricas de nossos antepassados, são eles os verdadeiros príncipes arrebatadores da Princesa do Paraibuna4.
Notas da autora.
1 Licenciada na Faculdade de História de Juiz de Fora - UFJF no ano de 2004, onde também recebeu o título de Bacharel em História e fez pós-graduação na Área de História da Saúde pela mesma instituição em 2007.
2 Na região da renana, pertencente á Prússia, ocorrera uma relativa expansão comercial e industrial. Na década de 1830 houve um avanço na situação econômica além através da criação do ZolIverein (união aduaneira dos Estados alemães) liderado pela Prússia, porém a plena expansão do capitalismo só iria realizar-se, entretanto, com a unificação política e a criação de um império alemão. Essa unificação foi iniciada em setembro de 1862 quando Otto von Bismarck foi designado o primeiro ministro da Prússia, sob reinado de Guilherme I, mas foi somente no ano de 1870 após findada a guerra contra Napoleão III que Bismarck consegue obter a unidade política do Estado.
3 Esta técnica constitui em um sistema de pavimentação de estradas e ruas, com pedra britada, misturada com saibro ou areia, e comprimida a rolo depois de regada
4- Muitas são as definições para Juiz de Fora, todas revelam o carinho e orgulho daqueles que a escolheram como lar e construíram e constroem sua História a cada dia. Títulos dado a Juiz de Fora: Princesa de Minas, Princesa do Paraibuna, Manchester Mineira, Barcelona Mineira, Atenas Mineira.