A HISTÓRIA DE HERMANN MATHIAS GÖRGEN

27 de abril de 1941, 48 exilados, sendo 30 homens, 15 mulheres e 03 crianças deixaram o Porto de Lisboa, no navio espanhol Cabo de Hornos, fugindo da implacável perseguição. O grupo era constituído por judeus e perseguidos políticos de pelo menos três países; Alemanha, Tchecoslováquia e França; o destino era Juiz de Fora.

Nilo Franck

Nilo

12/04/22 - 00:00



INTRODUÇÃO: 1. “ Por que contar esta história se a grande maioria dos personagens não permaneceram entre nós. Creio que embora não tivessem ficado aqui, trouxeram uma enorme contribuição ao desenvolvimento cultural de Juiz de Fora. A cada dia nos surpreendemos com novas histórias que tem a ver com a imigração alemã, e entendo que ainda temos muita coisa a pesquisar. Há um vazio muito grande de fatos ocorridos entre o final do século XIX até os anos 60 do século XX. Vamos continuar nossas buscas por esses fatos.”

2. Nós ainda não conseguimos avaliar a importância da imigração alemã para Juiz de Fora e para o Brasil. No caso específico de Juiz de Fora, os colégios, as indústrias, a cultura, a culinária, usos e costumes e, principalmente, a fé. Esta última para mim foi o principal legado. Para ilustrar a minha afirmação transcrevo a seguir um trecho de um texto encontrado entre os pertences de um imigrante alemão, que desembarcou da Barca Gundela, contido no livro “OS ALEMÃES E A BORBOLETA”- escrito por VICENTE DE PAULO CLEMENTE (CLEMENS): “...Chegamos ao porto do Brasil. Prostrados, de joelhos agradecemos a Deus”; Iniciamos a viagem para as terras do Brasil. Abençoe nossa passagem, Ò deus , com bênçãos mil; No mar, seja conosco, com sua paterna mão, assim, no Brasil chegaremos , firme, disposto e são; Por Deus somos chamados e nós não iríamos pensar a fazer essa viagem sobre esse mar; Com sua mão paterna Deus quer nos amparar, assim, com segurança, no Brasil vamos chegar; Deus disse a Abrahão, da sua terra vai emigrar, para um País longe, distante, que eu te vou mostrar; Nós também confiamos na palavra do Senhor e firmes acreditamos que Ele nos guia com Amor; Muitas vezes nós pedimos, a Deus em alta voz e agora vem se abrindo um país onde nós, conforme seu mandado, podermos imigrar, de miséria e maldade, Deus queira nos livrar; Imperador do Brasil, Deus queira proteger, com amor e com carinho ele vem nos receber; Ele queira nos amparar com sua mão viril, assim, alegremente viajarmos para o Brasil; Que alegria nós sentimos se essa viagem vai terminar, com alegria nos despedimos dos parentes que vão ficar, desejando-lhes saúde, descanso e bênçãos mil e viajarmos confiantes para a terra do Brasil.

Acredito que o espírito que trouxe essas pessoas até nós foi o mesmo demonstrado no texto acima, e pelos relatos, Deus proporcionou a todos melhores condições, materiais e espirituais para continuarem sua luta. NILO SERGIO FRANCK



27 de abril de 1941, 48 exilados, sendo 30 homens, 15 mulheres e 03 crianças deixaram o Porto de Lisboa, no navio espanhol Cabo de Hornos, fugindo da implacável perseguição. O grupo era constituído por judeus e perseguidos políticos de pelo menos três países; Alemanha, Tchecoslováquia e França; o destino era Juiz de Fora.

A vida dessas 48 pessoas, foi salva pelo historiador e filósofo alemão Hermann Mathias Görgen (Wallerfangen -23/12l908 + Bonn – 03/05/1994). Em Juiz de Fora ele trabalhou como Professor de filosofia, economia e história na Faculdade de Economia da Universidade de Juiz de Fora, da qual foi um dos criadores. Retornou para a Alemanha em 1954.

Depois de fugir de 03 países europeus (Áustria, Tchecoslováquia e Suiça), ele conheceu o cônsul brasileiro na Suiça Milton Vieira, que o ajudou a deixar de vez a Europa. A maneira encontrada para alicerçar a fuga, foi a construção de uma pequena indústria de manufaturados no Brasil. No seu plano a fábrica seria operada por mão de obra qualificada estrangeira, o que seria justificativa para conseguir do governo brasileiro o visto de entrada para os perseguidos. A lista era composta com os nomes dos 48 “operários” que receberiam a permissão para entrar no país, e escapar da morte; esta lista é semelhante ao plano arquitetado pelo industrial alemão Oskar Schindler, que conseguiu salvar mais de um mil judeus dos campos de concentração nazistas, e se tornou mundialmente conhecida com o filme vencedor do Oscar de 1993 – A lista de Schindler – dirigido por Steven Spielberg.

O braço direito de Hermann Görgen na sua empreitada que salvou a vida de 48 exilados que vieram para Juiz de Fora, em 1941, foi sua mulher Dori Schindel (*Munique 16/12/1915 + Bonn 11/01/2018).Ela era judia e teve que deixar a Alemanha por 02 vezes em 04 anos por causa de perseguições nazistas, a primeira em 1938, se mudou para a Suiça, onde cursou ciências químicas e matemática, a segunda vez em 1940 foi para a Áustria, onde conheceu o Professor Görgen. Em 1960 junto com Görgen criaram a Sociedade Brasil-Alemanha (DBG, da sigla alemã, que matém contatos entre instituições e empresas dos dois países até hoje.

A Intec começou a funcionar no final de 1941, trabalhando com infinidade de produtos: vasos sanitários, ornamentos de ferro batido e chapas, mas a falta de qualificação dos funcionários para uma produção industrial ficou clara e o grupo foi se desintegrando logo no primeiro ano, mudando-se para outras cidades. Alguns para o Rio de Janeiro, outros para São Paulo, ou para o Sul, segundo Marlen Eckl. A professosa Marlen, possui mestrado em letras pela Universidade de Mainz (Johannes Gutemberg, 2003) com um curso de Estudos judaicos na Ben Gurion University of the Negev, Beer Sheva, Israel em 1999, e doutorado em História pela Universidade de Viena, sob título: Das Paradies ist überall verloren. Das Brasilien bild in augewählten des National sequelismus. Traduzindo: A imagem do Brasil em obras escolhidas dos refugiados do noazismo. Orientador: Úrsula Prutsch). A empresa funcionou entre 1941 a 1954. Após o encerramento da empresa, o Prof Hermann, na solidão e no ostracismo, morou num sítio no bairro Borboleta, onde cuidou de horta com metodologia científica e fornecia aos mercados da cidade. Nota: Existe uma controvérsia sobre o local desse sítio; há quem afirme que ELE se localizava na Colonia de Cima – bairro São Pedro, onde hoje está localizada a Universidade Federal de Juiz de Fora, inclusive o prédio da atual prefeitura da universidade, parte dele é da casa onde Görgen morava.

Além de Mathias Görgen, outros integrantes da lista se notabilizaram em Juiz de Fora: Max Gefter, fundou e assumiu a regência da Sociedade Filarmônica de Juiz de Fora. Sob sua batuta, o jovem pianista Edmundo Villani Cortêz apresentou-se pela primeira vez em 1955, no Cine Theatro Central da cidade. Gefter faleceu na década de 60; hoje no bairro Santos Anjos existe uma rua com seu nome. Franz Joseph Hochleitner,nasceu em Salzburg em 30/04/1916. Formado em ciências aplicadas,veio para o Brasil como membro do grupo Görgen. Com espírito investigativo suscitado pela leitura da obra de Edmund Kiss, sobre a cosmogonia glacial e de Hans Hörbiger, publicou em 1957 o artigo “ A porta do sol de Tiahuanaco” ensaio de decifração de seus ideogramas, no jornal Diário Mercantil de Juiz de Fora. Em 1986 propõe a instituição do Setor de Arqueastronomia que mais tarde, com a ampliação das atividades veio a se constituir o Museu de Arqueologia e Etnologia Americana.Ingressou no curso de história da Faculdade de Filosofia e Letras (FAFILE), e atuou nela como professor de história da américa. A trajetória dele foi contada no livro Memórias Autobiográficas de Franz Joseph Hochleitner, Faleceu no dia 11 de julho de 2017, com 101 anos no HTO – Hospital São Vicente de Paulo.

Suzanne Eisenberg, nasceu em Munique em 29 de janeiro de 1909, concluiu o doutorado em línguas romanas em 1932, estudando com Karl Vossler, época em que conviveu com Dana Roda, nascida em Munique em 28/12/1909. Fugiu para Paris para trabalhar na Librarie Droz e engajou-se no Comitê Internacional pour Le Placement dês Intellectuels Réfugies. Foi presa e internada grávida no campo de Gurs em 1940. Foi libertada graças a intervenção de Görgen que a trouxe para o Brasil; sua filha nasceu com as irmãs de Santa Catarina em Petrópolis-RJ. Recomeçou a sua vida entre o Rio de Janeiro e Juiz de Fora.

Quanto a Hermann Görgen retornou a Alemanha em 1954. De 1957 a 1961 foi deputado do partido cristão democrata. Em 1958 esteve de novo no Brasil, desta vez como dirigente da seção América Latina do Parlamento Alemão. Foi agraciado com a Ordem do Cruzeiro do Sul, mais tarde com a Ordem Rio branco. De 1960 a 1994 (ano de sua morte) dirigiu a Sociedade Teuto-Brasileira criada por Ele e o Centro Latino Americano em Bonn na Alemanha e em sua lápide está escrito: “ AQUI JAZ UM AMIGO DO BRASIL”.

Podemos falar ainda sobre Johannes Hoffmann que foi chefe do almoxarifado da INTEC, pouco tempo depois foi para Alemanha e foi o responsável pelo retorno de Görgen para esse país. Walter Kreiser que implementou a produção da fábrica em Juiz de Fora; mais tarde se deslocou para Rolândia no Paraná, onde trabalhou para a fundação do Município de Maringá, onde faleceu em 1958. Ulrich Becher nasceu em Berlim em 01/02/1910. Casou-se em 1934 com Dana Roda. O casal foi morar em Juiz de Fora e de lá para o Rio de Janeiro. Comprou um sítio perto de Terezópolis-RJ ; EM 1943 foi para São Paulo. Era escritor e escreveu ao seguintes peças entre nós: Samba e Der Herr kommt aus Bahia (denominada macumba numa versão posterior), relatos publicados no Livro Exílio e Literatura, dão conta que Becher se sentia a vontade no Brasil. Faleceu em Basileia em 15/04/1990.






FONTES DE CONSULTA:

MATÉRIA DO ESTADO DE MINAS EDIÇÃO DE 23/11/2014 JORNALISTA MARCELO FONSECA:

LIVRO – PESSOAS –OS PROTAGONISTAS DA HISTÓRIA DE JUIZ DE FORA – LUIZ ANTONIO STEPHAN – 2021;

MEMORIAS DO HOLOCAUSTO – A HISTÓRIA DE HERMANN MATHIAS GÖRGEN.

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